Influência das mudanças climáticas na microbiota do solo

Publicado em: 01/11/2024.

As mudanças climáticas representam um dos maiores desafios atuais devido às suas consequências, como o aumento de temperatura, fenômenos climáticos extremos e outros impactos ambientais globais. Estas alterações influenciam todas as esferas do mundo, incluindo a pedosfera, camada da qual o solo está incluso, e a biosfera, local onde são encontrados os seres vivos.

Imagem: Causas e consequências das mudanças climáticas. Fonte: Portal Global ESG

A resiliência dos microrganismos do solo

Os organismos que vivem no solo, e suas interações, compõem ecossistemas agrícolas e florestais que realizam processos essenciais, como ciclagem de nutrientes, controle de pragas e doenças, degradação de poluentes e crescimento das plantas. Esses ecossistemas possuem interações complexas e interdependentes, muitas delas fundamentais para a agricultura, e as mudanças climáticas podem trazer consequências profundas.

À medida que o ambiente do solo muda, os microrganismos evoluem para responder de diferentes formas, adaptando-se, entrando em dormência ou até perecendo. Essas respostas variam conforme o estado genético e fisiológico dos microrganismos, sendo que sua adaptação depende da intensidade e duração das mudanças, bem como do tempo necessário para regular a expressão de genes ou adquirir novas mutações.

As mudanças climáticas também podem influenciar a estrutura e a resiliência das comunidades microbianas do solo. Por exemplo, o aumento de temperatura pode afetar as interações entre populações microbianas, influenciando a dispersão e a capacidade de adaptação de diferentes espécies. Essas variações promovem alterações na dinâmica das comunidades, favorecendo espécies oportunistas de rápido crescimento (estrategistas-r) ou aquelas de crescimento mais lento e resistentes a perturbações (estrategistas-K).

Além disso, as características do solo, como pH, salinidade, estrutura e teor de umidade, influenciam a criação de micro-habitats específicos, que determinam o tipo de microrganismos presentes e suas funções ecológicas. Essa variação no ambiente do solo tem efeitos diretos sobre a transformação do carbono e a ciclagem de nutrientes, processos essenciais para a fertilidade do solo e a produtividade agrícola.

Aumento da temperatura

O aumento da temperatura causa secas, que, por sua vez, levam à desertificação, que influenciam na adaptação da microbiota. Os solos desérticos apresentam limitação de carbono e umidade, aumentando a presença de organismos fotoautotróficos (organismos que utilizam luz como fonte de energia e dióxido de carbono como principal fonte de carbono) na superfície, os quais formam as denominadas “crostas biológicas”, principais fixadores de carbono (C) e nitrogênio (N) nesses solos.

Imagem: Crosta biológica. Fonte: National Geographic

Essas crostas biológicas, ou biocrostas, auxiliam o desenvolvimento de plantas resistentes à seca, que podem contribuir para a manutenção da ciclagem de nutrientes em condições de escassez hídrica e com o potencial de formação de pradarias.

Imagem: Sucessão ecológica com crosta biológica. Fonte: Gabriel Cimonetti de Almeida

Queimadas e incêndios, relacionados às secas, também afetam a microbiota do solo. A curto prazo, podem aumentar os teores de nutrientes e atividade microbiana, suprimir fungos, quebrar agregados e reduzir a aeração. No entanto, a longo prazo, causam a morte de células devido à desnaturação de proteínas, redução nos estoques de C e N, redução da biomassa microbiana, degradação e erosão do solo, além da dominação por microrganismos adaptados.

Outros fatores, como idade do solo, material de origem, textura, tipo de vegetação, topografia e composição da comunidade microbiana, influenciam diretamente a capacidade dos solos de sequestrar carbono. No entanto, são os decompositores microbianos que regulam a taxa de decomposição, impactando emissões de CO₂.

O aumento da temperatura altera a fisiologia dos decompositores, influenciando a eficiência da decomposição. Por exemplo, o calor pode provocar mudanças na composição fisiológica microbiana, e assim, afetar processos essenciais, como nitrificação e fixação de nitrogênio, moldando a composição da comunidade e o equilíbrio ecológico.

Em condições de seca prolongada, a microbiota do solo sofre uma queda em suas funções, reduzindo atividades enzimáticas e a ciclagem de nutrientes, o que compromete a fertilidade do solo e a produtividade agrícola, especialmente em culturas sensíveis à seca. Nessas condições, os fungos assumem um papel essencial, mantendo a ciclagem de carbono e nitrogênio, aproveitando sua capacidade de ocupar microporos e auxiliar na redistribuição de recursos pelo solo.

Aumento da precipitação e nível do mar

Com o aumento da precipitação causado pelas mudanças climáticas, os solos ficam saturados de água, criando condições anaeróbias que promovem processos como a desnitrificação e a metanogênese, resultando na liberação de gases de efeito estufa, como metano (CH₄) e óxido nitroso (N₂O). Essas condições anaeróbias aumentam a atividade de bactérias anaeróbias, favorecidas pelo excesso de umidade, enquanto reduzem a comunidade de fungos, que são mais sensíveis à falta de oxigênio.

Imagem: Água no solo no ponto de murcha, capacidade de campo e saturação. Fonte: Lepsch, 2017.

As zonas úmidas, como  as turfeiras, são particularmente sensíveis a essas variações, atuando como áreas de transição entre ambientes terrestres e aquáticos. Sob inundação, essas áreas podem passar de sumidouros para fontes de carbono, agravando o aquecimento global. No entanto, o alagamento das turfeiras também pode inibir a decomposição da matéria orgânica do solo (SOC), o que pode resultar em uma absorção líquida de carbono.

Em zonas costeiras afetadas pela intrusão de água salgada devido ao aumento do nível do mar, o sal e o sulfato alteram as dinâmicas de ciclagem redox e aumentam a mineralização da matéria orgânica, elevando a produção de CO₂. Esse fenômeno de salinização, quando prolongado, pode reduzir a atividade microbiana devido à escassez de recursos.

Conclusão

Como a microbiota do solo é sensível às mudanças ambientais, os diferentes impactos causados pelas mudanças climáticas resultam em alterações no funcionamento, composição e abundância relativa de comunidades microbianas, com grupos de organismos favorecidos e desfavorecidos.

Todos esses impactos desestabilizam processos naturais, e impactam na decomposição da matéria orgânica e ciclagem de nutrientes, que interferem diretamente no desenvolvimento de plantas. Por isso, é fundamental a adoção de práticas mais sustentáveis e que promovam a resiliência de ecossistemas.

*Texto de autoria da Equipe de Conteúdo do SolloAgro.

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