Publicado em: 06/06/2025.
Problemas silenciosos no campo podem comprometer a safra. Veja o que observar para manter a produtividade em alta.
Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), entre 2000 e 2021, o Brasil acumulou mais de 100 milhões de toneladas em perdas agrícolas, grande parte causada por falhas de manejo e estresses fisiológicos agravados por variações climáticas.
Esses gargalos muitas vezes passam despercebidos, mesmo em lavouras com solo fértil, sementes de qualidade e clima favorável.
A ausência de atualização técnica sobre os processos fisiológicos limita o desenvolvimento das culturas, o que afeta diretamente a rentabilidade.
Conhecer os principais erros cometidos no campo é o primeiro passo para ajustar o manejo e alcançar melhores resultados produtivos com maior eficiência.
Quer entender melhor esses gargalos e como superá-los?
Continue conosco. Boa leitura!
Erro 1: Ignorar a deficiência nutricional não aparente
A deficiência nutricional não aparente, também conhecida como “fome oculta“, refere-se à situação em que os níveis de nutrientes essenciais nas plantas estão abaixo do ideal para o ótimo desempenho fisiológico, mesmo que não haja sintomas visuais claros.
Imagem: fome oculta na zona de transição – nutrientes suficientes para produção parcial, mas limitações ainda reduzem o potencial máximo; excesso pode causar toxicidade. Fonte: SolloAgro, adaptado de Monteiro, Carmello e Dechen (s.d).
Essa condição é comum em culturas de alta exigência nutricional e pode passar despercebida por longos períodos, o que leva a perdas expressivas de produtividade.
Mesmo pequenos desvios na concentração de macronutrientes como nitrogênio (N), potássio (K), magnésio (Mg) e enxofre (S) podem afetar processos críticos como o transporte de fotoassimilados, desenvolvimento de órgãos reprodutivos e resistência a estresses.
A deficiência de micronutrientes como zinco (Zn) e ferro (Fe), embora menos visíveis, afetam a formação de clorofila e o funcionamento do aparelho fotossintético, que reduz a taxa de crescimento.
Isso ocorre porque o zinco (Zn) atua na atividade de enzimas como a anidrase carbônica, enquanto o ferro (Fe) é essencial para o funcionamento dos citocromos envolvidos na fotofosforilação.Ferramentas como a análise foliar periódica e técnicas de sensoriamento remoto (NDVI e clorofilômetros) são necessárias para a detecção precoce de deficiências subclínicas.
Erro 2: Desconsiderar a eficiência no uso da água
A eficiência no uso da água é um parâmetro fisiológico que relaciona a biomassa produzida por unidade de água transpirada.
Ela é regulada principalmente pela taxa de fotossíntese líquida e pela condutância estomática. A otimização desses dois fatores pode melhorar a performance das plantas em ambientes com limitações hídricas.
A anatomia foliar, o tipo metabólico (C3 ou C4) e a capacidade de controle estomático são variáveis determinantes.
Plantas do tipo C4, como o milho e o sorgo, tendem a apresentar eficiência mais alta que as C3 (como o trigo e a soja), devido à separação espacial dos processos fotossintéticos, o que reduz a fotorrespiração e aumenta a eficiência fotossintética.
Estratégias como o melhoramento genético para controle estomático eficiente, o uso de cobertura morta no solo e o manejo racional da irrigação podem aumentar significativamente esse parâmetro em lavouras comerciais. Para o(a) agrônomo(a), é necessário conhecer os mecanismos fisiológicos por trás da eficiência no uso da água para tomar decisões de manejo mais precisas, principalmente em regiões de maior restrição hídrica.
Erro 3: Manejar mal a luz e a fotossíntese
A luz é o insumo energético fundamental da fotossíntese, e sua má gestão, seja por sombreamento excessivo, densidade populacional inadequada ou arquitetura foliar desorganizada, compromete diretamente a taxa de assimilação de carbono pelas folhas.
Otimizar a eficiência fotossintética é uma das formas mais promissoras de aumentar a produtividade global das culturas. Por meio de melhoramento genético e engenharia metabólica, é possível otimizar rotas bioquímicas da fotossíntese, como o ciclo de Calvin, e melhorar a eficiência do uso da luz.
Essas modificações aumentam a produção de fotoassimilados e a taxa de crescimento, especialmente em condições de alta densidade de plantio ou em sistemas protegidos. Desta forma, é importante reforçar a integração entre práticas agronômicas, a escolha de cultivares e o uso de tecnologias como iluminação suplementar em estufas.
Erro 4: Negligenciar o papel dos fitormônios
Fitormônios são compostos orgânicos naturais que regulam praticamente todas as etapas do ciclo de vida da planta, como divisão celular, alongamento, enraizamento, brotação, floração e senescência.
A compreensão da biossíntese, transdução e sinalização hormonal é necessária para o manejo eficiente das culturas. Quando ignorados, os processos fisiológicos mediados por auxinas, citocininas, giberelinas, etileno e ácido abscísico (ABA) podem se tornar desregulados, comprometendo o desenvolvimento vegetal.
Imagem: Exemplos de hormônios vegetais e suas formulações químicas. Fonte: Santner A. et al. (2009).
À vista disso, destaca-se a importância dos hormônios no enfrentamento de estresses abióticos.
O ácido abscísico, por exemplo, induz o fechamento estomático em situações de déficit hídrico e regula o balanço hídrico e a homeostase celular. Auxinas influenciam diretamente o enraizamento e a dominância apical, enquanto citocininas retardam a senescência e promovem o crescimento de tecidos meristemáticos.
Erro 5: Desprezar o estresse oxidativo
O estresse oxidativo em plantas ocorre quando há um desequilíbrio entre a produção de espécies reativas de oxigênio (EROs) e a capacidade da planta em neutralizá-las por meio de sistemas antioxidantes.
Imagem: Esquematização de causa e consequências do acúmulo de espécies reativas de oxigênio em plantas. Fonte: Hansel F. D. et al. (2021).
Esse tipo de estresse é comum sob condições ambientais adversas, como seca, salinidade, radiação UV e temperaturas extremas.
As EROs como o peróxido de hidrogênio (H₂O₂) e o radical superóxido (O₂⁻), embora essenciais como moléculas sinalizadoras, tornam-se tóxicas quando acumuladas em excesso, uma vez que oxidam lipídios, proteínas e ácidos nucleicos.
Os principais mecanismos bioquímicos de defesa antioxidante incluem enzimas como superóxido dismutase (SOD), catalase (CAT) e peroxidases (POD). Essas enzimas atuam de forma coordenada para eliminar as EROs e restaurar o equilíbrio redox celular.
O desempenho das culturas diante do estresse oxidativo depende da capacidade da planta em modular esses sistemas, o que é influenciado pela nutrição mineral, especialmente de micronutrientes como zinco (Zn), manganês (Mn), ferro (Fe) e cobre (Cu), que são cofatores dessas enzimas antioxidantes.
Conclusão
Compreender os processos fisiológicos é importante para uma agricultura mais eficiente, produtiva e resiliente. A correção desses cinco erros pode representar a diferença entre um sistema de produção limitado e um manejo de alta performance, sustentado por conhecimento científico aplicado à realidade do campo.
*Texto redigido pela Equipe de Conteúdo do Programa SolloAgro.
Referências:
Hansel, F. D., Rodrigues, M., Zabini, A. V., Zavaschi, E., Lazzarini, P., Robson Murate, Thiago De, Barros Sylvestre, Bueno, A., S Ataíde, & Bonini, F. G. (2021). Nutrição mineral como aliada das plantas na tolerância a estresses ambientais. https://doi.org/10.13140/RG.2.2.15306.08643
Santner, A., Calderon-Villalobos, L. & Estelle, M. Plant hormones are versatile chemical regulators of plant growth. Nature Chemical Biology 5, 301–307 (2009). https://doi.org/10.1038/nchembio.165.
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