Publicado em: 10/10/2025.
Nanopartículas aumentam a eficiência de nutrientes, defensivos e conservação de alimentos, o que reduz impactos ambientais.
De acordo com o programa europeu Farm to Fork Strategy, a aplicação de fertilizantes químicos deve ser reduzida em 20% nos próximos anos, exigindo o uso de tecnologias mais eficientes e sustentáveis.
Nesse contexto, a nanotecnologia tem se destacado como uma ferramenta capaz de transformar a forma como produzimos alimentos, oferecendo maior eficiência no uso de nutrientes, defensivos e recursos naturais.
O que é nanotecnologia?
De acordo com o Prof.Valtencir Zucolotto, docente do Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo e do Programa SolloAgro, a nanotecnologia é, essencialmente, um conjunto de ferramentas que nos permite manipular a matéria.
“Sempre vale a pena lembrar da nossa relação como humanidade com os materiais. Há centenas de milhares de anos transformamos materiais em ferramentas, desde a pedra lascada e polida até a Idade do Bronze. A nanotecnologia é o último estágio de precisão dessa oficina em que transformamos materiais em ferramentas úteis”, explicou.
Até metade do século XX, já produzíamos plásticos, cerâmicas e metais bastante úteis, mas sem controle preciso no nível atômico ou molecular. “A ideia de controlar o material molécula a molécula começou a ser pensada na segunda metade do século passado, com Richard Feynman, físico teórico, que imaginou como seriam as propriedades dos materiais se tivéssemos esse controle”, acrescentou.
A nanotecnologia permite fabricar materiais quase invisíveis a olho nu. “Esse tamanho está na escala nanométrica, ou seja, um nanômetro equivale a 10⁻⁹ metros. A nanopartícula é mil vezes menor que o diâmetro de um fio de cabelo e também menor que uma célula humana”, destacou.
O professor resumiu: “Nanotecnologia é essa habilidade que adquirimos nos últimos 30 ou 40 anos de produzir partículas extremamente pequenas, que podem ser plásticas, metálicas ou cerâmicas. Trabalhamos com elas em dispersões aquosas ou dentro de outros materiais, e isso abre aplicações enormes em materiais, medicina e agricultura”.
Qual a importância da nanotecnologia?
Segundo o Prof. Valtencir, tanto na saúde humana quanto na agricultura, o tamanho das partículas faz toda diferença.
“É o único tamanho que conseguimos levar algo para dentro da célula. Se fosse uma micropartícula, não funcionaria, porque nossas células estão na microescala, medindo cerca de 40 a 60 micrômetros. Uma micropartícula do tamanho da célula simplesmente não entra”, explica.
Ele continua: “Quando usamos nanopartículas, que são mil vezes menores que uma célula, elas conseguem penetrar dentro dela. Podem atingir o núcleo ou permanecer no citoplasma, liberando o medicamento, nutriente ou defensivo exatamente onde precisa. Não existe nenhuma outra escala que permita isso”.
Imagem: Modelo de aplicação simplificado de nanofertilizantes e nanopesticidas. Fonte: Traduzido de Liu et al. (2021).
O papel da nanotecnologia na agricultura
Na agricultura, elas podem ser aplicadas de três formas principais:
- Nano-fertilizantes: para aumentar a eficiência do uso de nutrientes;
- Nano-pesticidas e nano-herbicidas: para controle de pragas e plantas daninhas com menor impacto ambiental;
- Nanoemulsões e nanossensores: para conservação pós-colheita e monitoramento das condições do solo e das plantas.
Imagem: Diagrama esquemático dos diferentes benefícios da aplicação de nanopartículas compostas por diferentes elementos químicos às plantas. Fonte: Traduzido de Quintarelli et al., 2024.
Nano-fertilizantes
Os nano-fertilizantes representam uma das aplicações mais promissoras da nanotecnologia agrícola. Eles permitem a liberação controlada e gradual de nutrientes, o que aumenta a eficiência de absorção pelas plantas e reduz as perdas para o ambiente.
Estudos recentes indicam que Óxido de Zinco (ZnO), Óxido de Ferro (Fe₃O₄), Dióxido de Titânio (TiO₂) e Dióxido de Cério (CeO₂) em escala nanométrica podem melhorar a fotossíntese, aumentar o teor de clorofila, estimular o crescimento radicular e reduzir o estresse salino e hídrico em culturas como soja (Glycine max), arroz (Oryza sativa), trigo (Triticum aestivum) e canola (Brassica napus).
Além disso, a substituição parcial de fertilizantes convencionais por nanoformulações pode reduzir em até 30% a quantidade total de insumos aplicados, o que diminui a emissão de Óxido Nitroso (N₂O), um dos principais gases de efeito estufa agrícolas.
Outro benefício é a biofortificação, com o aumento do teor de micronutrientes em grãos e frutos, melhorando a qualidade nutricional dos alimentos.
Nano-pesticidas e nano-herbicidas
A nanotecnologia permite reformular pesticidas e herbicidas em escala nano, reduzindo doses, o que aumenta a eficiência e controla a liberação do ingrediente ativo.
Os nano-herbicidas encapsulados, em alguns casos, apresentaram 100% da mortalidade de plantas daninhas.
De modo semelhante, os nano-inseticidas feitos de óxidos metálicos (como ZnO, Fe ou Si) têm mostrado eficácia no controle de insetos-praga como Spodoptera litura e Helicoverpa armigera, além de dificultar a resistência de pragas aos princípios ativos.
Nanotecnologia na conservação pós-colheita
As nanoemulsões e os nanocompósitos atuam na proteção de frutas e hortaliças, o que prolonga sua vida útil e previne o crescimento de fungos e bactérias.
Além disso, o uso de nanossistemas de desumidificação e filmes biodegradáveis à base de nanopartículas de sílica tem aumentado a durabilidade de frutas em até 30%.
Desafios da nanotecnologia
Os principais desafios para a aplicação de nanomateriais na agricultura envolvem temas ainda pouco conhecidos.
Por exemplo, não está claro como alguns deles são absorvidos e transportados dentro da planta e ainda está em estudo como as nanopartículas são transmitidas das plantas para os seres humanos.
Até o momento, o conhecimento sobre os mecanismos de translocação de nanopartículas é limitado.
Conclusões
A nanotecnologia aplicada à agricultura representa uma das mais avançadas fronteiras da ciência agrária contemporânea.
Seu potencial vai muito além da eficiência produtiva: trata-se de uma estratégia de mitigação dos impactos climáticos, conservação ambiental e valorização da qualidade alimentar.
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*Texto redigido pela Equipe de Conteúdo do SolloAgro.
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